Este será o primeiro artigo de um total de três artigos onde iremos manifestar a primazia petrina. Esta primeira parte tratará das palavras evangélicas do nosso Senhor e como demonstraram tal dogma.

Mateus 16, 18-19

O capítulo começa com os fariseus aproximando-se de Cristo para submetê-lo a uma prova,  mas o Senhor os recrimina, chamando-os de hipócritas por saberem distinguir o aspecto do céu mas não saberem distinguir o sinais dos tempos (Mt 16,1-4), e então parte. Encontrando os apóstolos, Cristo os aconselha a guardarem-se do fermento dos fariseus e dos saduceus, que é a sua doutrina (Mt 16, 5-12), e, chegando em Cesareia, Cristo questiona os apóstolos sobre quem Ele é aos olhos do povo (Mt 16, 13-14), e em seguida Ele questiona quem Ele é aos olhos dos próprios apóstolos, e então Cristo recebe uma resposta que muito o alegra:

"Disse-lhes Jesus: “E vós quem dizeis que eu sou?” 
Simão Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo!”. 
Jesus, então, lhe disse: “Feliz és, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas meu Pai que está nos céus.
E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. 
Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”."
São Mateus 16, 15-19

Cristo, após questionar os apóstolos sobre quem Ele era, alegra-se com a resposta de Pedro, afirmando que aquela resposta lhe foi dada pela Pai que está no céu. Então prossegue lhe dizendo “E eu te digo: tu és Pedro”, uma recomposição das palavras do próprio Pedro “tu és Cristo”.  
E continua: “e sobre esta pedra eu edificarei a minha Igreja”. É importante notar que a palavra utilizada por Cristo para referir-se a Pedro é a mesma utilizada por Cristo para dizer que sobre ela seria edificada a Sua Igreja:

"Levou-o a Jesus, e Jesus, fixando nele o olhar, disse: “Tu és Simão, filho de João; serás chamado Cefas (que quer dizer pedra)"
São João 1,42

Portanto Cefas=Pedra=Pedro (diante desta tradução! Pois a tradução mais adequada é rocha). De qualquer maneira, o importante é a conexão entre a palavra empregada por Cristo para dirigir-se a Pedro e a palavra empregada por Cristo para referir-se ao que seria utilizado como base para a edificação da Sua Igreja. A distinção das palavras advém de uma flexão de gênero que era inexistente no aramaico. O feminino e masculino passam a existir em sua tradução para o grego, então pedra (que no grego é feminino) teve de ser flexionada para o masculino para referir-se a Pedro, e assim continuamente nas demais línguas. Portanto, na sua forma original o trecho é detido de ainda maior simbologia:

“Tu és Cefas e sobre esta Cefas eu edificarei a minha Igreja”

E qual a propriedade desta pedra? A de servir como base para a edificação da Igreja de Cristo! Ademais, poderemos ir ainda mais fundo na simbologia da passagem, não só o nome é importante, o ato de mudar também o é!

"De agora em diante não te chamarás mais Abrão, e sim Abraão, porque farei de ti o pai de uma multidão de povos."
Gênesis 17, 5

Deus muda, em um pacto, o nome de Abrão para Abraão, Abrão significava “excelso pai”, e então Deus muda seu nome para Abraão que significa “pai de muitos”. Assim, podemos ver que o conteúdo do nome é de suma importância e faz referência ao papel que o seu portador desempenha para Deus. Deus promete a Abrão que ele será o pai de uma multidão de povos logo após mudar seu nome para Abraão “pai de muitos”. Os Exemplos se repetem na bíblia, Sarai, a mulher de Abraão, tem seu nome modificado para Sara (princesa), pois Deus disse que dela sairiam reis (Gn 17, 15-16). Jacó “aquele que segura pelo calcanhar” tem seu nome mudado para Israel “aquele que lutou com Deus” pois "ele lutou com Deus e com os homens, e venceu" (Gn 32, 28-29)
Vemos agora com extrema nitidez a simbologia da passagem, Cristo muda o nome de “Simão” para “Cefas=Pedra” em referência a seu papel de pedra para fundação da Igreja de Cristo. Também utiliza-se da mesma palavra pra descrever ambos os sujeitos, o apóstolo e a pedra sobre a qual será erguida a sua Igreja. E também usa-se da recomposição da frase de Pedro, “Tu és Cristo!” e quem é Cristo? “O Filho do Deus vivo!”, “E eu te digo: Tu és Cefas” e quem é Cefas? “A Cefas sobre a qual Eu edificarei a minha igreja”.
Portanto podemos dar ênfase a essas 3 conexões entre Pedro e a pedra sobre a qual a Igreja de Cristo é edificada: 
1-Pela simbologia da mudança de nome de Simão para Pedro, que demonstra o seu propósito de ser aquela pedra. 
2-Pela igualdade entre a palavra utilizada para referir-se a Pedro e a palavra usada para referir-se a pedra sobre a qual a Igreja será edificada. 
3-Pela semelhança entre a estrutura da resposta dada por Pedro a Cristo e a resposta dada por Cristo a Pedro.

Ainda assim há aqueles que insistem em dizer que, na passagem de (Mateus 16, 18), Pedro não é a pedra referida por Cristo para a construção da Sua Igreja. Aos que se apegam demasiadamente nesse falaz julgamento, pensando que, descaracterizando essa passagem, as demais se esvaziarão de valor, saibam que é uma tarefa inútil! Outras passagens não deixarão de evidenciar o seu verdadeiro significado por causa de uma adesão errônea a essa, pelo contrário, apenas irão expor o caráter contraditório da leviana interpretação, como que expondo uma pincelada colorida em um quadro monocromático. Essas outras passagens serão abordadas mais para frente neste mesmo artigo ou nos próximos.

"Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”.
São Mateus 16, 19

E então Cristo promete a Pedro as chaves do Reino dos Céus, as chaves se referem à autoridade, e essa simbologia é confirmada pela própria continuação da passagem, “tudo o que ligares na terra será ligados nos céus, e tudo que desligares na terra será desligado no céu”. As chaves são entregues a Pedro, a ele é dado a sua posse e o poder de ligar e desligar, por isso todos de alguma forma devem estar ligados a ele, para que assim estejam ligados aos céus.
Ademais (Mateus 16, 19) faz referência a (Isaías 22, 20-24):

"Contra Sobna, prefeito do palácio. Eis o que diz o Senhor, Deus dos exércitos: “Vai ter com esse ministro,
que cava para si um sepulcro em um lugar elevado, que talha para si uma morada na rocha. Que propriedade tens aqui, que parentes tens nela, para ousares cavar-te nela um sepulcro? 
Eis que o Senhor te lança com força, ó grande homem, arremessa-te, rolando, 
lançando-te como uma bola para uma terra vasta em todo o sentido. É lá que morrerás, lá será a tua famosa tumba! Ó vergonha da casa de teu senhor!
Eu te deporei de teu cargo e te arrancarei do teu posto."
 "Naquele dia, chamarei meu servo Eliacim, filho de Helcias. 
Eu o revestirei com a tua túnica, o cingirei com o teu cinto, e lhe transferirei os teus poderes; ele será um pai para os habitantes de Jerusalém e para a casa de Judá. 
Porei sobre seus ombros a chave da casa de Davi; se ele abrir, ninguém fechará, se fechar, ninguém abrirá; 
eu o fixarei como prego em lugar firme, e ele será um trono de honra para a casa de seu pai. 
Dele estarão pendentes todos os membros de sua família, os ramos principais e os ramos menores, toda espécie de vasos, desde os copos até os jarros”."
Isaías, 22, 15-24


Observem a referência, a passagem narra a deposição de Sobna e a escolha do servo Eliacim para ocupar o seu posto. A simbologia da mudança de poder sobre o reinado da casa de Davi é feita por meio da entrega das chaves, e essa mudança também é seguida pelas palavras utilizadas por Cristo como referência ao narrar o poder concedido a Pedro, "se ele abrir ninguém fechará, se fechar, ninguém abrirá". E o servo será como um pai para os habitantes de Jerusalém, e dele estarão pendentes todos os membros de sua família. Pedro é o servo escolhido por Cristo para deter o poder do Reino, assim como o servo Eliacim foi escolhido para representar o poder da monarquia da casa de Davi, Pedro é escolhido para representar a monarquia do reino dos céus, e ambos são ligados pela mesma simbologia, a entrega das chaves seguida das palavras que enfatizam sua autoridade: "e aquilo que ele ligar será ligado nos céus, o que abrir não poderá ser fechado". E em Pedro, como membros da Igreja de Cristo, somos todos pendentes.
Mas não termina aqui, Isaías faz referência a outra grande passagem que demonstra a autoridade de Pedro outorgada por Cristo.

João 21, 14-17


"Era esta já a terceira vez que Jesus se manifestava aos seus discípulos, depois de ter ressuscitado. 
Tendo eles comido, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, amas-me mais do que estes?”. Respondeu ele: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”. Disse-lhe Jesus: “Apascenta os meus cordeiros”. 
Perguntou-lhe outra vez: “Simão, filho de João, amas-me?”. Respondeu-lhe: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”. Disse-lhe Jesus: “Apascenta os meus cordeiros”. 
Perguntou-lhe pela terceira vez: “Simão, filho de João, amas-me?”. Pedro entristeceu-se porque lhe perguntou pela terceira vez: “Amas-me?” –, e respondeu-lhe: “Senhor, sabes tudo, tu sabes que te amo”. Disse-lhe Jesus: “Apascenta as minhas ovelhas.
Em verdade, em verdade te digo: quando eras mais moço, cingias-te e andavas aonde querias. Mas, quando fores velho, estenderás as tuas mãos, e outro te cingirá e te levará para onde não queres”."
São João 21, 14-18


Cristo pergunta a Pedro se ele o ama, e a cada resposta Cristo pedia a Pedro para apascentar os seus cordeiros, as suas ovelhas. Tão clara é essa passagem que é difícil até de comentar, o que há de explicar que não esteja explicado? Cristo deixa suas ovelhas ao cuidado de Pedro, o apóstolo agora detém a tutela das ovelhas de Cristo. 
E também é possível enxergar o paralelo com (Isaías 22) nessa passagem. Cristo diz que quando Pedro era moço ele cingia-se a si próprio, mas quando se tornasse velho ele estenderia suas mãos e um outro o cingiria. Em (Isaías 22, 21) ele fala que o servo seria cingido, e a ele seria transferido poder. “Eu o revestirei com a tua túnica, o cingirei com o teu cinto, e lhe transferirei os teus poderes”. 
Pedro é o representante de Cristo, o seu vigário, o servo escolhido por Cristo para pastorear suas ovelhas, e também para confirmar os demais, como veremos a seguir.

Lucas 22, 31-32

Mas antes de prosseguir direto a passagem vamos analisar o seu contexto e ler em qual situação a mesma está inserida, isso dará luz ao seu verdadeiro valor, nos auxiliando a compreender ainda mais a sua intenção. Vamos ao contexto:
Ocorre a Santa Ceia, Cristo serve os apóstolos dando-lhes de comer e beber o seu Santo Corpo transubstanciado, a sua própria carne e o seu próprio sangue. Ao final da celebração Cristo avisa que um deles haveria de traí-lo, então uma grande discussão se instala entre os apóstolos para saber quem haveria de ser esse. E essa discussão é logo substituída por outra:

"Surgiu também entre eles uma discussão: qual deles seria o maior. 
E Jesus disse-lhes: “Os reis dos pagãos dominam como senhores, e os que exercem sobre eles autoridade chamam-se benfeitores." 
São Lucas 22, 24-25

Os Apóstolos, que antes discutiam sobre quem era o traidor entre eles, agora discutem quem é o maior entre eles. Então, Cristo cita os pagãos, e como seus governantes dominam a eles. Em total oposição ao governo almejado por Cristo, lição que ele dará na passagem seguinte: 

"Que não seja assim entre vós; mas o que entre vós é o maior, torne-se como o último; e o que governa seja como o servo." 
São Lucas 22, 26

Cristo dá uma lição de humildade, pede que entre os apóstolos não ocorra o que ocorre com os pagãos. Mas que, ao contrário, o que é maior entre eles seja como o último, e o governante seja como servo, que governe com plena humildade.
Há de notar-se que Cristo responde instruindo como o maior entre eles deve proceder, ao invés de responder que não há um maior entre eles, ou os recriminar por acreditarem nisso. 

"Pois qual é o maior: o que está sentado à mesa ou o que serve? Não é aquele que está sentado à mesa? Todavia, eu estou no meio de vós, como aquele que serve." 
São Lucas 22, 27

Cristo usa-se como exemplo para os Apóstolos, e faz alusão a Santa Ceia que acabara de realizar, onde Ele serviu os apóstolos e, no entanto, é maior que eles. Dando vida a proposição que ensinara, de que “aquele que governa que seja como servo” (Mt 22,26).

"E vós tendes permanecido comigo nas minhas provações; 
eu, pois, disponho do Reino a vosso favor, assim como meu Pai o dispôs a meu favor, 
para que comais e bebais à minha mesa no meu Reino e vos senteis em tronos, para julgar as doze tribos de Israel”.
São Lucas 22, 28-30

Cristo então fala que o Reino que lhe fora disposto ao Seu favor, pelo Pai, Ele irá dispor a favor dos apóstolos, pela permanência dos mesmos com Ele em meio as Suas provações. Comerão e beberão com Cristo em Seu reino e, sentados em tronos, haveriam de julgar as doze tribos de Israel, sendo então como juízes para os seus perseguidores.

“Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo;
mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça; e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos.”
São Lucas 22, 31-32

Como dito, o verdadeiro valor dessa passagem só poderia ser obtido quando lido conjuntamente com suas predecessoras. Em meio a discussão de quem era o maior entre os discípulos, Cristo vem a dar, primeiramente, um ensinamento; que entre eles não ocorresse o que ocorrem em meio aos pagãos, mas que o governante fosse como servo assim como Cristo foi para com eles. Depois diz que o reino, que lhe fora disposto pelo Pai, Ele irá dispor a favor dos apóstolos, pela permanência que os mesmos tiveram para com Ele em meio as suas provações. E então fala “Simão, Simão...” 
E Nosso Senhor continua, fala que Satanás reclamou Pedro, para que fosse peneirado como o trigo, isto é, para que fosse tentado e assim como o trigo, que é peneirado pela sacudida, o apóstolo haveria de ser sacudido pela tentação. No entanto Cristo diz que rogou por ele, para que sua confiança não desfalecesse, ou seja, para que a fé do apóstolo não se esvaísse com a tentação. 
E continua, “tu, por tua vez, confirma os teus irmãos”, Sendo assim, a confirmação que Cristo faz a Pedro, o apóstolo haveria de fazer com seus irmãos. Por isso Pedro é o chefe dos apóstolos, enquanto ele é confirmado por Cristo, os demais hão de ser confirmados por ele, a pedido do próprio Senhor. 

Considerações finais

Vemos aqui as promessas feitas pelo nosso Senhor a Pedro e que revelam a autoridade singular de tal apóstolo. Pedro é a pedra sobre a qual a Igreja está edificada, o portador das chaves do Reino dos Céus, o detentor do poder de ligar e desligar, o pastor encarregado de apascentar as ovelhas de Cristo, o maior entre os apóstolos e aquele que confirma os seus irmãos. 
Portanto, é impossível negar que “a santa Igreja romana foi anteposta às outras Igrejas não por quaisquer decisões conciliares, mas obteve seu primado da palavra evangélica do Senhor e Salvador” (“Primado da Sé Romana” Decretum Gelasianum, Gelásio I (✝ 496 d.C.)).